Sento
E percebo que começo a olhar para um nada aparentemente inexistente
É quando olho pra dentro de mim
E percebo a quantidade de faces que costumo usar
E essa é a pior
Largada numa calçada, olhando carros passarem
Pessoas desinteressantes
Vivendo suas vidas desinteressantes
Eu
Munida de um inferno astral e quatro cigarros
E algumas cédulas na carteira, pra qualquer emergência
Os cabelos desgrenhados, o delineador
Borrado
A minha paradoxal falta de consciência
Num momento de introspecção
Me examino de novo
E encontro uma garotinha encolhida num quarto escuro
Os olhos feridos pela luz do meu cigarro
Que não é muita, mas um verdadeiro farol pra quem à muito não sabe o que é
O iluminar da luz do dia
Ela não chora, não se mexe, não reage
Só me pragueja, me amaldiçoa
Grita, escreve onomatopéias agressivas
E eu, ser passivo e indignado
Recolho-me à minha insignificância
E vou fumar meu Holliwood sentada na calçada
Em casa
Despida em frente ao espelho
Esquadrinho cada centímetro de um corpo que julgo meu
Não reconheço mais as curvas do meu rosto
Não encontro mais meus tão sedosos e compridos cabelos
Não sinto mais o aroma de sabonete que insistia em encarnar em mim
Mesmo horas depois do banho
Perco meus sentidos
Não vejo minha boca mover-se quando canto uma canção que não ouço
Não sinto o cheiro que procuro em mim
Assim como não me sensibilizo ao tocar minha própria pele
E mesmo quando meus sentidos voltam, faço questão
De continuar meu momento nostálgico
Saudade de mim
De quando eu era menina e não tinha questões
De quando meu maior problema era chegar ao galho mais alto da mangueira
De, ao invés de despir minha roupa, despir minhas máscaras
Que até nas horas de extrema sinceridade
Me tornam falsa, inerte, superficial
Absurda
Não é de dormir que eu tenho medo
É de como vou acordar.